"O direito é criado pelo homem, é um produto tipicamente humano, um artifício sem entidade corporal, mas nem por isso menos real que as máquinas e os edifícios." - Gregorio Robles

21.10.21

Da natureza autoritária do Estado

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Tenho lido a tese de doutorado de Hugo de Brito Machado, "Os direitos fundamentais do contribuinte e a efetividade da jurisdição", 2009. O que me agrada em particular é a abordagem antiautoritária, decididamente do lado do contribuinte. O outro lado é o do poder, o da força, o Leão — que ruge forte! Diante da clara desigualdade de armas, é preciso inclinar a balança para o lado mais fraco. O sistema já traz mecanismos para isso, mas como aponta Machado, e qualquer advogado militante pode confirmar, a Administração é pródiga em puxar a sardinha pro seu lado. 

Binenbojm em seu já clássico "Uma teoria do direito administrativo" trata disso. Aborda a origem autoritária do Direito Administrativo e a reprodução de padrões do Antigo Regime apesar de nascido do efervescente caldo cultural, político e ideológico das Luzes. A narrativa "oficial" da origem libertária do Direito Administrativo seria "louvável, não fosse falsa". Nas palavras do doutrinador na obra citada:

O surgimento do direito administrativo, e de  suas categorias jurídicas peculiares (supremacia do interesse público, prerrogativas da Administração, discricionariedade, insidicabilidade do mérito administrativo, dentre outras coisas), representou antes uma forma de reprodução e sobrevivência das práticas administrativas do Antigo Regime que a sua superação.

Diante da voracidade do Estado, essa besta-fera, são necessários, voltando a Hugo de Brito Machado, mecanismos de controle. Já na abertura de sua tese Machado dá o tom: "o Direito é um sistema de limitações ao poder". 

Gosto de matizar o tema da seguinte forma. Sobre a crítica do Estado eu concordo, como marxista, que, fruto da dominação de classe que é (e me reporto ao "A origem da família, da sociedade privada e do Estado" de Engels), o Estado é autoritário ab ovo. Contudo, justamente por isso possui uma contradição — tem o papel de garantir o equilíbrio e a manutenção de tal sociedade fragmentada em classes. Isso implica que para evitar o colapso social precisa agir em prol dos estratos oprimidos. De modo que, na sociedade capitalista, é importante um Estado presente que garanta saúde, educação e demais direitos fundamentais. A opção a isso é relegar tais necessidade humanas básicas aos imperativos de mercado e ao "salve-se quem puder" da lei da selva neoliberal.

Isso é: em seu nascedouro o Estado é arbitrário e instrumento das classes dominantes, mas dialeticamente é fundamental no fornecimento e garantia dos direitos fundamentais, portanto não podemos aceitar seus desmanche e sucateamento.

Quanto a tributação, tema da tese de Hugo de Brito Machado, costumo repisar o seguinte: o problema não é pagar tributos, mas sim quando os tributos não retornam em benefícios sociais. É que não dá para jogar a criança fora junto com a água suja. A tributação é uma importante e milenar forma de arrecadação e o problema não está nela em si, e sim quando não cumpre seu desiderato, que é a satisfação das necessidades públicas.

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