Sinal amarelo aceso: não poucas boas vozes têm alertado que os projetos de lei orgânica das polícias civil e militar fazem parte de uma conspiração miliciana, ligada ao bolsonarismo, para um futuro golpe de Estado. Isso porque a iniciativa legislativa acaba por reduzir o poder dos governadores sobre suas polícias, que ganharão maior autonomia. De fato não cheira bem. Enquanto o debate sobre a desmilitarização das polícias avança (em 2012 a ONU recomendou o fim da Polícia Militar brasileira), os projetos em questão querem até criar a patente de "general" para a PM. É a contramão da História. Mesmo que não haja nenhuma intentona bolsonarista por trás — o que não seria de todo inverossímil, convenhamos — trata-se de uma iniciativa extremamente inadequada. Como é o grosso da produção legislativa no país.
As associações de policiais defendem a medida, claro. Aqui há um traço clássico da sociedade brasileira: o corporativismo. Cada categoria olha para seu próprio umbigo. Não é privilégio dos policiais que querem flanar livres, leves e soltos; está em toda parte. A magistratura é extremamente corporativista, por exemplo. Nem pensem em tocar no que é deles. A advocacia também, pode-se dizer; mas nesse caso, e não falo por espírito, opa, corporativista, não se recebe grana pública. Somos um ministério privado, afinal (art. 2º, §1º, da lei 8.906). Nesse caso é coerente que defendamos nossas prerrogativas, já que temos contra nós de um lado o arbítrio estatal e de outro a lei da selva do mercado capitalista. É o corporativismo nas carreira públicas que traz incômodo.
Em minha opinião, há um déficit republicano. Todos puxam o cobertor, curto, para seu lado. A visão de conjunto, que demanda que se ceda em prol da coletividade, fica ausente. Lembram-se dos lobbies dos militares para ficarem fora da reforma da previdência? Os demais que se explodam. No meu ninguém bota a mão. E agora, José? Ninguém aceita partilhar do sacrifício em prol da sociedade. Contudo é importante denunciar o seguinte: o argumento do sacrifício necessário tem sido muito utilizado para justificar os maiores absurdos. O "andar de cima" historicamente é poupado (melhor dizendo, se poupa a si mesmo) dos cortes impostos à escumalha. Como não entender que, diante de uma profunda iniquidade sistêmica, as demais categorias estejam batalhando pelo seu também?
Questões estruturais de solução a longo prazo, me parece. Evidentemente caso haja solução. Precisamos de um Direito Administrativo atualizado, por exemplo, e por isso não me refiro à cantilena neoliberal do Estado mínimo. Ao contrário, o Estado Democrático e Social de Direito do séc. XXI deve ser robusto e eficiente. O serviço público deve ser propriamente público, o que demanda uma mudança de mentalidades do balcão à presidência. E assim por diante. Voltaremos ao ponto.
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