Li o paper "A isenção do imposto de renda sobre a distribuição de lucros e dividendos à luz do princípio constitucional da isonomia" de Danilo Miranda Vieira e Luciana Grassano de Gouvêa Melo (link aqui) e senti uma agradável nostalgia ao me deparar com um trecho referenciado em Celso Antônio Bandeira de Mello:
As discriminações são compatíveis com o princípio da igualdade quando existe um vínculo de correlação lógica entre o fator de discrímen eleito pela norma e a desigualdade de tratamento em função dele conferida, desde que tal correlação não seja incompatível com interesses protegidos pela Constituição. Assim, a discriminação não pode ser fortuita, devendo existir uma conexão racional entre o tratamento legal diferenciado e a razão que lhe serve de fundamento.
No fragmento acima os autores estão citando o clássico "Conteúdo jurídico do princípio da igualdade" do mestre Bandeira de Mello. Tenho essa obra, um livro fininho de capa verde que comprei na Saraiva da Ouvidor anos e ano atrás.
Nostalgia porque sempre me recordo de uma causa em que utilizei a lição. É um episódio que já contei em outro blog: meu cliente era obstado de participar de concurso público para bombeiro militar por causa de uma limitação etária no edital. A idade máxima eram os 30 anos. Meu cliente, aos 32, já seria "velho" demais para ser bombeiro. Mandado de segurança, pois sim. Havia um caso claro de discriminação etária. Entrou aí a lição Bandeira de Mello: discriminações podem ocorrer, desde que, em suas palavras, haja "uma adequação racional entre o tratamento diferenciado construído e a razão diferencial que lhe serviu de supedâneo". Em bom português, a discriminação precisa ter um bom motivo. Não era o caso ali: por que alguém de 32 seria pior — a ponto de não poder participar do certame — do que alguém de 30? Qual o fundamento, biológico, científico, etc., racional, enfim, que justificasse o tratamento diferenciado? Se se tratasse de um sujeito de 60 anos, bem, aí sim teríamos uma justa causa, não? Afinal a atividade de bombeiro requer foça, agilidade, destreza e outros atributos que se presume alguém nessa faixa etária já não teria. Ainda outro argumento: essa discriminação não está na lei, por que poderia o edital fazê-la? E assim por diante.
Ao fim e ao cabo a própria Administração republicou o edital do concurso sem o limite etário. Deve ter chovido ação contra a exigência ilegal. Se a comissão organizadora tivesse consigo esse pequeno livrinho, muito trabalho poderia ter sido poupado...
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