Eu já disse em outro post que nosso elogio da democracia não pode ser acrítico ou otimista à moda poliana. Antes de tudo é preciso consignar que o próprio conceito comporta sentidos — em seu berço, a Grécia antiga, uma sociedade escravista, aliás, estrangeiros e mulheres eram excluídos. Não existe linguagem sem engano, como diz Ítalo Calvino em suas "Cidades invisíveis", é portanto importante definir exatamente o que queremos dizer pelo termo.
Bom, decerto não é a tirania da maioria. O cálculo meramente numérico, no feitio utilitarista, deve ser rejeitado. O cálculo apenas numérico vai dizer que, em uma sala com dez pessoas, oito podem votar que duas devem se jogar pela janela. A maioria decidiu, afinal. É um exemplo tosco, mas apenas para situar as coisas — a maioria decide, ok, mas dentro de parâmetros e respeitados os direitos da minoria.
Incide aqui o papel contramajoritário do Judiciário. O que queremos dizer com isso? Que o Legislativo e o Executivo, apesar de sufragados pela vontade popular — afinal seus membros são eleitos, são escolhidos pelo povo — podem ter seus atos derrubados pelo Judiciário, cujos membros não passam pelo mesmo processo de escolha. Nesse sentido, ao declarar a inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo o Judiciário parece estar indo contra a "vontade da maioria".
Contudo, além da própria Constituição — portanto fruto de representantes populares, o constituinte originário — prever isso, há o fato, mesmo metajurídico, de que a democracia pressupõe não apenas o respeito à vontade da maioria como também o respeito aos direitos e garantias fundamentais das minorias.
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