"O direito é criado pelo homem, é um produto tipicamente humano, um artifício sem entidade corporal, mas nem por isso menos real que as máquinas e os edifícios." - Gregorio Robles

23.11.19

Combater a corrupção é uma coisa, destruir as empresas, outra


O trecho a seguir é de João Pedro Accioly in "Improbidade administrativa e proibição de contratar" (Lumen Juris):

(...) a proibição de contratar com o Poder Público é sanção de natureza gravíssima e de efeitos muito severos, de tal sorte que a sua aplicação deve se dar apenas em face de fatos excepcionalmente graves.

O autor disserta, na aludida obra, sobre a proibição de contratar com o Poder Público, consequência prevista dentre as penas da lei 8.429/ 92 (a que, conforme sua ementa, "dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo, emprego ou função na administração pública direta, indireta ou fundacional e dá outras providências").

Argumenta Accioly que tal punição tem fortes impactos quanto à própria existência vital da empresa, haja vista o impacto sobre sua receita- afinal, a depender da localização, ramo econômico desempenhado etc., é razoável ter em mente que muitas empresas têm na contratação com o Poder Público sua principal, ou mesmo a única, fonte de renda, de modo que a proibição de contratação implicaria no fechamento de portas com todas as consequências socialmente nefastas que daí advêm (desempregos, redução na circulação de riqueza etc.). É portanto uma punição extrema, a ser aferida fundamentadamente e mediante escrutínio rigoroso do juiz.

Concordo. Parece-me que os justiceiros de plantão, à moda lavajatista, estão sempre mais preocupados com o show pirotécnico do que propriamente com um combate sóbrio e adequado ao problema da corrupção (de improbidade em geral). Pensam que "mão de ferro" é sinônimo de eficiência, e lá vão arengando em torno de mais e mais pesadas penas, sem ter a menor compreensão sistêmica do resultado de sua sanha inquisitorial.

Não estou, evidentemente, defendendo o empresariado ímprobo e corrupto. Ao contrário: é defender sua punição sem que isso implique na extensão da pena ao conjunto da sociedade- trabalhadores, a cadeia produtiva envolvida, consumidores etc. Falta exatamente isso, a visão de conjunto.

A imagem do post é de Diego Rivera, retratando trabalhadores industriais.