"O direito é criado pelo homem, é um produto tipicamente humano, um artifício sem entidade corporal, mas nem por isso menos real que as máquinas e os edifícios." - Gregorio Robles

29.7.24

Das contradições do fenômeno estatal


O Estado é um ente que carrega uma complexidade profunda. Como parto da posição marxista, vejo nele produto histórico da acumulação privada — a leitura indicada no tema é o "A origem da família, da propriedade privada e do Estado" de Engels, que pode ser acessada na seção "Texto clássicos" na parte inferior do blog.

Sob tal abordagem, o Estado, fruto como seria da luta de classes, está a serviço da classe dominante. É um instrumento de subjugação dos oprimidos e despossuídos da sociedade. As instituições, quaisquer que sejam — Judiciário, parlamento, polícia etc. — seriam de forma mais ou menos explícita tocadas por tais grupos dominantes, encaminhando as coisas conforme seus interesses.

Esse entendimento é essencialmente correto, mas deve ser visto cum grano salis. Esse mesmo marxismo, por adotar o método dialético, nos ensina a enxergar as contradições nos fenômenos — no caso do Estado, a contradição que salta aos olhos é que, mesmo que seja em última instância instrumento das classes dominantes, ele também é uma garantia para os grupos marginalizados.

Isso é facilmente verificável. O Estado Democrático & Social de Direito está repleto de garantias e modalidades protetivas do indivíduo, independentemente de sua classe ou status. Pegue nossa Constituição; seu rol de direitos e garantias fundamentais é vastíssimo. Há coisas como uma defensoria pública, um sistema único de saúde universal e gratuito, uma seguridade social. São todos conquistas civilizatórias incorporadas às dimensões de direitos fundamentais (também chamados direitos humanos), e o grande garantidor disso é, quem?, o Estado, senhoras e senhores.

Apesar dos pesares o Estado é o único garantidor do interesse público, diz Eros Grau (reproduzo de memória mas o trecho é do "O direito posto e o direito pressuposto"). Nesse sentido enfraquecer o Estado, como querem os neoliberais, os corifeus do Estado "mínimo", é tirar o pouco de salvaguarda que os mais pobres possuem. O Estado "mínimo" é a lei da selva; direitos fundamentais apenas para quem pode pagar, tudo sob a ótica egoísta e excludente da economia de mercado. Diante do aumento do fosso de desigualdade no mundo não é admissível aceitarmos isso. Não precisamos portanto de um Estado "mínimo", ou "enxuto", mas sim de um Estado robusto na correta medida e eficiente em aplicar políticas públicas.

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